Batendo de frente com o preconceito

Como vivemos num mundo em que a competência não se restringe a conhecimentos, mas inclui apresentação, atitudes e comportamentos, o preconceito surge como uma barreira na vida dos adeptos do “Body Mod”, tornando-se um dos principais obstáculos a ser rompido pelos “desbravadores” dessa nova manifestação cultural.

Binha Cas, membro do Uai Fly Suspension.

Binha Cas, membro do Uai Fly Suspension.

“Sempre sofri e ainda sofro preconceito e acho que isso nunca vai acabar porque o que é diferente sempre choca e as pessoas costumam repudiar o que é diferente, sofro preconceito até com o estilo do meu cabelo, mas levo isso na boa, acho que cada um deve fazer o que quiser desde que não prejudique os outros.  Seu corpo é seu templo, faça dele o que bem quiser!”, diz Binha Cas, que iniciou sua vida no body modification muito jovem, Minha primeira modificação foi furar a orelha, na época tinha uns 10 anos, sempre gostei de tatuagens, piercings, adornos indígenas, etc…, explica.

O preconceito na maioria das vezes parte dos próprios familiares, como aconteceu com Arthur Gomes, “Até dentro de casa já sofri preconceito. As pessoas não aceitam que uma pessoa possa querer mudar sua aparência pelo gosto de ser distinto, vivemos em um país demasiado!”. No âmbito familiar o preconceito se apresenta, justificado pela preocupação com o fato do mercado de trabalho ser, geralmente, discriminativo contra adeptos do “Body Mod”, ou, muitas vezes, buscam justificar suas condutas preconceituosas baseando-se em dogmas do conservadorismo religioso, demonstrando uma visão extremamente etnocêntrica sobre o assunto.

Arthur Gomes, body piercing no  Beagá Ink Tattoo.

Arthur Gomes, body piercing no Beagá Ink Tattoo.

A divulgação da Body Modification pode ser uma grande aliada para a quebra de barreiras preconceituosas, segundo Arthur Gomes, “A exposição da cultura da Body Mod é algo bom, pois assim o tabu é quebrado e as pessoas começam a ver a modificação corporal como arte, é assim que ela tem que ser vista”.  Por outro lado, pode ser algo que venha a contribuir para o aumento do preconceito, como diz Binha Cas, “A divulgação da ‘body mod’ no meu ponto de vista tem dois lados, o bom e o ruim. O bom é que com ela podemos explicar o que fazemos e o porquê fazemos, abrindo a cabeça das pessoas para entender um pouco mais nosso mundo, mas por outro lado podemos alcançar pessoas que não se preocupam em entender, ou conhecer um pouco mais sobre o assunto, passam a ver todos da ‘body mod’ como aberrações, por isso acho que a divulgação pode até aumentar o preconceito”.

Por fim, é necessário relativizar. O Antropólogo Everardo Rocha, em seu livro “O que é Etnocentrismo”, 1984, cita a relativização como uma das mais importantes ideias para se entender o próximo. Portanto, para romper com o preconceito, basta sabermos entender e utilizar o conceito de relativização no nosso dia-a-dia.

“Quando vemos que as verdades da vida são menos uma questão de essência das coisas e mais uma questão de posição: estamos relativizando. Quando o significado de um ato é visto não na sua dimensão absoluta mas no contexto em que acontece: estamos relativizando. Quando compreendemos o “outro” nos seus próprios valores e não nos nossos: estamos relativizando. Enfim, relativizar é ver as coisas do mundo como uma relação capaz de ter tido um nascimento, capaz de ter um fim ou uma transformação. Ver as coisas do mundo como a relação entre elas. Ver que a verdade está mais no olhar que naquilo que é olhado. Relativizar é não transformar a diferença em hierarquia, em superiores e inferiores ou em bem e mal, mas vê-la na sua dimensão de riqueza por ser diferença”. (“O que é Etnocentrismo”, Everardo Rocha, Ed. Brasiliense, 1984)

Guilherme Caldeira